Trecho do Livro "Cleptópolis"

 


"As noites em Cleptópolis eram cheias de emoções, tudo podia acontecer, e de fato acontecia. Em todos os cantos da cidade, pelas incontáveis ruas mal iluminadas, era possível ver desde carros se mexendo embaixo de alguma árvore ou no final de uma via sem saída, a grupos de pessoas em barzinho bebendo, rindo, gritando ou mesmo indo às vias de fato pelos mais variados motivos. Mas não só de curtição vivia Cleptópolis: crimes aconteciam e muitos, especialmente nos bairros da zona leste e norte. E a mídia marrom se fartava como urubus em cima de carniça, exibindo nos seus jornais impressos fotos de cadáveres ensanguentados, amarrados ou até mesmo mutilados. Alguns alegavam que morria mais gente em Cleptópolis por motivos de violência do que nas cidades mundo afora que estavam em guerra. Todos os dias, a polícia tinha trabalho de sobra, mas recursos adequados para elucidar os crimes, não exatamente, e isso deixava o policial Adalberto revoltado. Quando entrou para a polícia, ele sonhava em acabar com a criminalidade na cidade, mas não demorou muito viu que seria um sonho praticamente impossível de se realizar e pouco a pouco foi perdendo o entusiasmo, a ponto de pensar em se demitir; mas como ficou com medo de ser reconhecido e morto por algum ex-presidiário, resolveu continuar na profissão para não perder o porte de arma e a possibilidade de matar algum vagabundo em nome da lei.

O policial odiava visceralmente “bandidos” ou “vagabundos”, como ele gostava de chamar, tanto quanto cachaceiros; ver um homem maltrapilho embriagado falando bobagens e com hálito de cerveja ou qualquer outra bebida alcoólica, deixava o nobre Adalberto com os nervos à flor da pele. A primeira vez em que ele deu uma surra num vagabundo, ficou dois dias sem dormir direito, sentindo remorso. Mas com o tempo, acabou acostumando-se a ponto de não conseguir dormir se não desse uma surra num vagabundo todos os dias.

Ele só saía em diligências ou ia a campo fazer trabalho investigativo quando era sobre algum crime violento; brigas domésticas ou batidas em bares, blitz ou ronda em áreas vermelhas, ele evitava e o delegado tentava não mandá-lo, por uma razão: o policial linha dura não gostava de receber arrego, seja de bicheiros, comerciantes e mais recentemente, de traficantes que pagavam pela omissão da polícia. A primeira lição que o detetive aprendeu quando entrou para a corporação, foi: “ou você se corrompe ou você se omite”, lição essa dita por um veterano que o livrou de ser exonerado quando ele pensou em delatar uma “panelinha” que rolava na delegacia, onde alguns oficiais ganhavam dinheiro de cafetinas, donas de bordéis de luxo.

Depois daquela experiência ruim, Adalberto preferiu se omitir e contentou-se em investigar casos de assassinatos e crimes passionais, tarefa que se resumia a ir ao local do ocorrido, fazer averiguação, falar com potenciais testemunhas e depois passar o dia analisando provas."


Disponível na UICLAP e na Amazon

https://www.amazon.com.br/Clept%C3%B3polis-Alberto-Rocha/dp/6500892674

https://loja.uiclap.com/titulo/ua56232/


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Entrevista com a Autora Graziella Moraes

Entrevista com a Autora Katia Pinno

Trecho do livro "Poderes De Uma Sem-Teto